Quem nunca se viu preso nas garras do temido “e se?”? Essa pequena pergunta, tão aparentemente inofensiva, tem o poder de nos arrastar para uma espiral de ansiedade e indecisão. "E se eu tomar a decisão errada?", "E se eu fizer isso e me arrepender?", "E se as coisas derem errado?" – essas são questões que todos enfrentamos em algum momento, mas por que elas nos causam tanto sofrimento? E como a psicanálise pode nos ajudar a entender essa ansiedade que parece nos paralisar?
Sigmund Freud acreditava que muitas das nossas angústias vêm de conflitos internos, especialmente quando estamos diante de escolhas. Para Freud, o ser humano é constantemente pressionado por desejos contraditórios. Quando nos deparamos com uma decisão importante, essas forças entram em choque dentro de nós, criando um conflito inconsciente. A indecisão surge justamente dessa luta interna – é como se parte de nós quisesse seguir um caminho, enquanto outra parte estivesse presa ao medo do desconhecido (Freud, 1920).
O "e se?" é, na verdade, um reflexo desse medo do desconhecido. Quando nos questionamos repetidamente sobre as possíveis consequências de uma decisão, estamos tentando, de alguma maneira, controlar o futuro e evitar qualquer erro ou arrependimento. No entanto, esse desejo de controle, ao invés de nos ajudar, muitas vezes nos paralisa. O futuro é imprevisível, e o desejo de ter todas as respostas antes de agir é, em essência, um desejo impossível de satisfazer. Freud sugeria que a tentativa de evitar a incerteza, através da indecisão, só aumenta nossa ansiedade, pois nos afastamos da experiência real de viver e tomar decisões (Freud, 1926).
Além disso, essa ansiedade do “e se?” pode ser entendida como uma maneira de nosso inconsciente tentar nos proteger. É como se, ao ficarmos parados no campo da indecisão, estivéssemos evitando enfrentar os medos mais profundos de falhar, de perder ou de ser rejeitado. O "e se?" nos mantém numa zona de conforto ilusória, onde não precisamos confrontar o desconhecido, mas também não avançamos. Essa postura pode nos dar uma falsa sensação de segurança, mas, ao mesmo tempo, nos impede de crescer e evoluir (Freud, 1930).
Outra faceta interessante dessa indecisão, segundo a psicanálise, é a idealização do "caminho perfeito". Muitas vezes, nossa mente constrói a ilusão de que existe uma escolha certa, que nos levará ao sucesso, à felicidade, à ausência de arrependimentos. Mas, na realidade, a vida é composta por escolhas imperfeitas. Cada caminho tem suas vantagens e desvantagens, e esperar que uma decisão nos leve à perfeição é um pensamento irrealista que só aumenta a ansiedade (Freud, 1915).
A psicanálise nos convida a enxergar a indecisão sob uma nova perspectiva: como um reflexo do nosso medo de errar e do nosso desejo de evitar o sofrimento. No entanto, aprender a viver com a incerteza, aceitar que o erro faz parte do processo, pode nos libertar dessa prisão emocional. Tomar decisões é, em última análise, um ato de coragem, de aceitar que não podemos controlar tudo, e que o crescimento pessoal muitas vezes nasce justamente daquilo que não podemos prever.
Portanto, o “e se?” que tanto nos atormenta pode ser um sinal de que estamos tentando evitar a vida real, cheia de escolhas e incertezas. Talvez a saída seja simples, embora não fácil: aceitar o risco, tomar uma decisão e entender que, independentemente do caminho escolhido, sempre haverá algo a aprender.
Referências
Freud, S. (1915). Instincts and Their Vicissitudes. The Standard Edition of the Complete Psychological Works of Sigmund Freud.
Freud, S. (1920). Beyond the Pleasure Principle. The Standard Edition of the Complete Psychological Works of Sigmund Freud.
Freud, S. (1926). Inhibitions, Symptoms and Anxiety. The Standard Edition of the Complete Psychological Works of Sigmund Freud.
Freud, S. (1930). Civilization and Its Discontents. The Standard Edition of the Complete Psychological Works of Sigmund Freud.
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